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Ano 4 Agosto 2004

Projeto
Programa Habitare apóia aprimoramento de tecnologias de estabilização de solos




A implantação de uma fábrica de ´tijolos ecológicos´, na cidade de Volta Redonda, está entre as conquistas de um projeto que vem recuperando e aprimorando tecnologias de estabilização de solos para construção de moradias. O aproveitamento da terra em obras é milenar. No entanto, foi sendo abandonado no Brasil, tornando-se sinônimo de pobreza. “Um equívoco”, avalia o professor da Coppe/UFRJ, Francisco Casanova. Há 25 anos ele coordena trabalhos que têm como objetivo aperfeiçoar o uso do solo estabilizado para a habitação de interesse social. As pesquisas são desenvolvidas com a colaboração do Grupo Geotemah, ligado ao Programa de Engenharia Civil da Coppe/UFRJ. O apoio financeiro vem do Programa de Tecnologia de Habitação (Habitare/FINEP), do CNPq e da Fundação de Auxílio à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj).


O grupo estuda a estabilização do solo a partir de diferentes ´misturas´. De acordo com o professor, o agente estabilizante pode ser o cimento, a cal, polímeros, resinas, entre outros. Dependendo da constituição da massa, surgem as diferentes denominações: solo-cimento (uma das mais comuns), solo-cal, solo-cimento-cal, solo-polímeros, solo-resíduos, etc. São também pesquisadas diferentes aplicações. Entre elas, a fabricação de tijolos em olarias a frio.

Para produção dos blocos de solo-cimento/cal nesse sistema, a terra é misturada à água e a dosagens específicas dos outros dois componentes. Depois os tijolos são moldados em uma prensa. Ao invés de irem ao forno, os blocos produzidos a frio permanecem sete dias protegidos do sol. Então ficam prontos para serem usados. Essa é apenas uma explicação simplificada e esse processo só gera tijolos de qualidade a partir de procedimentos adequados e monitorados.


Vantagens



A equipe acredita no potencial da tecnologia e leva em conta uma série de vantagens para refinamento do sistema: redução do custo unitário final, racionalização do projeto e da obra, facilidade de construção e rápida execução. Qualidade e beleza também são listadas entre as vantagens. O aperfeiçoamento que pode garantir estes benefícios foi inspirado em laboratórios europeus. Depois de se formar em Química na UFRJ, o professor Casanova passou pela Suíça, França e Portugal, como aluno de mestrado e doutorado. Agora, com sua equipe, busca aprimorar o trabalho, estudando as peculiaridades dos solos brasileiros. Os esforços mais recentes investem na inclusão de resíduos industriais como matéria-prima ou como agentes estabilizantes na fabricação de ´tijolos intertravados´.

Utilizando tijolos que se encaixam uns nos outros, o sistema dispensa argamassa. O rejunte exterior é necessário, mas a possibilidade de montagem reduz o tempo de construção. Além de contar com encaixes, os blocos são vazados, permitindo a colocação das tubulações para redes hidráulicas, de telefone e de energia. As instalações embutidas evitam a quebra das paredes e são colocadas durante o erguimento da alvenaria. Quando a construção atinge o pé-direito e recebe a cobertura, está pronta para ser habitada.

Ao contrário dos tijolos de argila queimada, que quando quebram têm que ser jogados fora, os de solo estabilizado podem ser moídos e reaproveitados. Caso o solo do próprio local da obra possa ser utilizado na confecção dos tijolos, o custo do frete também pode ser eliminado. Levando em conta estas e outras vantagens, o grupo estima que os tijolos de solo estabilizado proporcionam uma redução do custo final da obra em torno de 30% a 40%. Segundo o pesquisador, a tecnologia tem como vantagem adicional oferecer um conforto térmico e acústico superior ao das construções convencionais.


Tijolos e cimento com adição de resíduos



A tecnologia também busca aliar redução de custos a um produto menos agressivo ao meio ambiente. Indústrias de química, metalurgia, siderurgia, mineração, pedreiras e galvanização são sub-produtoras de uma série de resíduos que estão entrando na composição de tijolos e cimentos. A cada tonelada de aço produzido, mais de 300 quilos de ´lava´ escorre dos altos fornos, a 1600°C. Resfriada, torna-se uma espécie de areia, formada pela argila do minério de ferro misturada com silício e alumínio: a escória. O cimento de sobrenome ´verde´, que vem sendo estudado pela equipe e pode ter a escória como uma de suas matérias-primas, demora mais a secar do que o cimento convencional, mas é mais compacto e resistente. Também não precisa ir para o alto forno, como acontece nas indústrias convencionais.

Na cidade de Volta Redonda, a fábrica de ´tijolos ecológicos´ foi montada para produção de blocos com adição de resíduos industriais. Os blocos são usados em programas habitacionais populares. O processo a frio usado na fábrica é outra vantagem da tecnologia de estabilização de solos. Estima-se que a produção de mil tijolos tradicionais de argila queimada dependam de um metro cúbico de madeira para o funcionamento dos fornos, o que equivale à queima de cerca de seis árvores de porte médio.


Monitoramento



Mas não é só chegar e ir fazendo. O processo de confecção dos tijolos a frio tem que ser monitorado. Devem ser tomados cuidados desde a seleção do solo adequado até a correta execução das fundações e da alvenaria. O processo exige a aplicação de um protocolo técnico, que envolve fatores como a escolha do solo, a dosagem dos ligantes hidráulicos, o correto ajuste de diferentes parâmetros relativos ao solo e à mistura deste com o estabilizante. Além disso, os blocos de solo estabilizado não são adequados a qualquer tipo de construção. A consulta de um engenheiro especialista é indispensável. Segundo o professor, o nível de detalhamento de projeto deve ser o maior possível. Tudo aquilo que as normas exigem para a alvenaria estrutural de blocos de concreto, armado ou não armado, vale para o solo estabilizado.




A construção com qualidade usando tijolos estabilizados intertravados também depende da regularidade na dimensão, principalmente com respeito à altura dos blocos. A padronização dos tijolos acelera o assentamento (de acordo com a equipe, a produção em metros quadrados/dia/hora pode chegar a triplicar) e reduz a necessidade de nível e prumo. Outro cuidado indispensável que deve ser delegado a um bom mestre de obras é a prévia colocação dos dutos e da ferragem a ser fixada na fundação, assim como a de pontos de luz, torneiras, registros, etc. O descuido nesse início implica exatamente naquilo que se quer evitar: a quebra, ou pior, derrubada de partes da alvenaria. Além disso, construções de maior porte, com dois ou mais pavimentos, grandes extensões de paredes e aberturas, devem obrigatoriamente contar com a orientação de um engenheiro especializado em alvenaria estrutural




Em principio, o solo de qualquer jazida pode ser usado para a confecção de paredes monolíticas, blocos e tijolos de solo estabilizado. Os mais indicados são aqueles que possuem de 50 a 70% de teor de areia no composto. Esse controle de qualidade do solo está entre as dificuldades de uso do solo, já que há necessidade de análises para avaliação das caracteríticas físicas e químicas necessárias. Estas avaliações são dispendiosas, dependem de pessoal qualificado e constantes análises de material. Para facilitar esse processo, em conjunto com alunos o professor Casanova desenvolveu uma metodologia baseada em testes que dispensam o laboratório, podendo ser aplicada diretamente na jazida ou no canteiro de obras. A metodologia reduz custos e pode ser aplicada em cinco dias.


Potencial Social



Para o professor, por suas características e vantagens, a tecnologia de estabilização de solos tem potencial para colaborar com a redução do déficit habitacional, mas está acontecendo o contrário. É a classe alta, que está construindo com solo estabilizado. “Há uma série de razões para isso. Falta de planejamento, a política, o preconceito das pessoas simples, que associam o solo à pobreza, o desconhecimento técnico e os erros do passado”, avalia. “Dentro do quadro econômico-social vigente, o solo se revela como o material com maior vocação para retomar o hábito de compatibilizar harmonicamente o projeto arquitetônico, os materiais locais e o sistema construtivo”, defende o professor que vai às favelas para ensinar como construir casas com tijolos de solo estabilizado.

Reunindo moradores em escolas improvisadas, ele ensina a ´fórmula´ para ser posta em prática na forma de mutirão. Estudantes de pós-graduação da Coppe/UFRJ, alunos de graduação da Escola de Engenharia da UFRJ e da Faculdade de Arquitetura (FAU/UFRJ), além de alunos do Colégio de Aplicação da UFRJ e do CEFET/RJ, participam de diferentes etapas do trabalho.

Apesar do potencial dessa tecnologia, em suas viagens o professor tem constatado o fechamento de olarias a frio. “As causas são as mesmas encontradas em outras atividades, porém geralmente o motivo principal do fracasso é a falta total de orientação especializada para a fabricação de tijolos de acordo com as especificações técnicas requeridas”, lamenta o professor. Segundo ele, diferente do concreto, não existe o caso do solo estabilizado mais ou menos bom. “O estado intermediário na tecnologia da estabilização de solos é problemático. Está a um passo do fracasso. Ou ela é aplicada corretamente, e o produto é bom, ou os problemas logo aparecerão”.

Mas o professor é otimista e ressalta um dos objetivos do grupo que já participou da construção de centenas de casas em comunidades carentes e programas habitacionais populares. “Nosso objetivo não está limitado a tentar ver o que está à distância, mas sim, em fazer o que está ao alcance”.


Informações e envio
de material:

Arley Reis
Redação e Edição


Mais informações sobre o projeto:

Francisco José Casanova
Professor
Coppe/UFRJ
0 xx 21 2290-1730


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